sexta-feira, 18 de maio de 2018

A PARTILHA DOS DIREITOS TRABALHISTAS EM CASO DE DIVÓRCIO OU NA DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL





No Brasil, o regime da comunhão parcial de bens é o regime mais adotado pelos casais.

Também não se ignora o fato de muitos casais optarem pela informalidade da união estável. Para tais pessoas, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais o regime da comunhão parcial de bens.

Dessa forma, a discussão aqui tratada interessa tanto para aqueles que são casados na comunhão parcial de bens quanto para aqueles que vivem em união estável.

No contexto social brasileiro, e muito em função da crise econômica do país, sabe-se que boa parcela da população não chega a constituir grandes fortunas ao longo da vida, sendo que o principal patrimônio acumulado é oriundo do esforço individual e fruto do TRABALHO de cada um.

Assim, muito se questiona acerca da divisão do patrimônio do casal que vivia em regime de comunhão parcial de bens. Os direitos trabalhistas, em especial o FGTS, devem ser partilhados em caso de divórcio?

Inicialmente, é oportuno fazer alguns esclarecimentos acerca do casamento pelo regime de comunhão parcial. Neste regime de casamento, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as seguintes exceções (Art. 1.659 do Código Civil):

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III - as obrigações anteriores ao casamento;
IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Assim, no regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento. Em outras palavras, com exceção das sete hipóteses acima, todo o patrimônio adquirido ao longo do casamento presume-se adquirido por esforço comum do casal, portanto deverá ser partilhado, meio a meio.

Como se vê, os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (salário e demais direitos trabalhistas), pela regra expressa no Código Civil não entra na partilha de bens, ou seja, não se comunica e não deve ser dividido. Entretanto, o Judiciário e boa parte da Doutrina vem mitigando ou flexibilizando a redação literal deste dispositivo.

“Apesar da determinação expressa do Código Civil no sentido da incomunicabilidade, o STJ entende que não se deve excluir da comunhão os proventos do trabalho recebidos na constância do casamento, sob pena de se desvirtuar a própria natureza do regime. A comunhão parcial de bens funda-se na noção de que devem formar o patrimônio comum os bens adquiridos onerosamente na vigência do casamento. Os salários e demais ganhos decorrentes do trabalho constituem-se em bens adquiridos onerosamente durante o casamento. Pela lógica, devem se comunicar” (Márcio André Lopes Cavalcante – comentários ao Informativo 581-STJ).

"Não há como excluir da universalidade dos bens comuns os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (CC, art. 1.659, VI). Ora, se os ganhos do trabalho não se comunicam, nem se dividem pensões e rendimentos outros de igual natureza, praticamente tudo é incomunicável, pois a maioria das pessoas vive de seu trabalho. O fruto da atividade laborativa dos cônjuges não pode ser considerado incomunicável, e isso em qualquer dos regimes de bens, sob pena de aniquilar-se o regime patrimonial, tanto no casamento como na união estável, porquanto nesta também vigora o regime da comunhão parcial (CC, art. 1.725). (...) De regra, é do esforço pessoal de cada um que advêm os créditos, as sobras e economias para a aquisição dos bens conjugais. (...) (DIAS, Maria Berenice. Regime de bens e algumas absurdas incomunicabilidades. Disponível em: www.mariaberenice.com.br)

Portanto, os direitos trabalhistas, inclusive o FGTS, foram adquiridos ANTES ou DEPOIS do casamento não se comunicam. Os direitos trabalhistas, inclusive o FGTS, quando adquiridos DURANTE o casamento, se comunicam e devem ser partilhados.


“Os proventos do trabalho recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento, compõem o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges, independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do outro não. A incomunicabilidade prevista no inciso VI do art. 1.659 do CC somente ocorre quando os valores são percebidos em momento anterior ou posterior ao casamento. STJ. 2ª Seção”. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016

Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, não deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal. Ao contrário, deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos DURANTE a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja realizado imediatamente à separação do casal. Os proventos do trabalho recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento, compõem o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges, independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do outro não. A incomunicabilidade prevista no inciso VI do art. 1.659 do CC somente ocorre quando os valores são percebidos em momento anterior ou posterior ao casamento. STJ. 2ª Seção. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016.


O mesmo raciocínio é válido caso um dos cônjuges ingresse com uma ação trabalhista. Caso obtenha êxito na ação, as verbas trabalhistas devidas por força de decisão judicial, ainda que pendentes de pagamento, devem ser partilhadas quando demonstrado que se relacionam ao período de convivência dos cônjuges (ou companheiros).

Caso o FGTS recolhido no período em que perdurou o casamento ou a união estável não seja liberado antes do fim do relacionamento, o valor da meação deverá ser integrado no cálculo da partilha e, caso não seja possível o abatimento, deverá ser reservado junto ao órgão gestor, a Caixa Econômica Federal.

Caso o FGTS tenha sido utilizado na aquisição de imóvel do casal, deve-se apurar os valores que foram depositados na conta vinculada antes e depois do casamento ou do início da união estável. Por exemplo: caso o FGTS utilizado tenha sido integralmente recebido antes do casamento, não se cogitará a divisão do patrimônio e o imóvel pertencerá exclusivamente ao cônjuge que utilizou o fundo.

Edgar Yuji Ieiri