quinta-feira, 17 de abril de 2025

Ganhar a causa é fácil. Difícil é receber: o papel (real) do SISBAJUD


 

Na rotina da advocacia trabalhista, é comum que o maior obstáculo surja não durante a fase de conhecimento, mas sim depois da sentença. A execução, muitas vezes tratada como um apêndice do processo, é marcada por inefetividade e frustração. Foi nesse cenário que surgiu o SISBAJUD, anunciado como solução tecnológica para dar eficiência à busca por patrimônio do devedor. A pergunta que se impõe, no entanto, é: o sistema entrega o que promete?

1. A promessa de celeridade e efetividade no processo do trabalho

A Justiça do Trabalho é historicamente afetada por índices elevados de insucesso na fase de execução. Em razão disso, o SISBAJUD passou a ser empregado como ferramenta inicial nas tentativas de satisfação do crédito reconhecido judicialmente. O sistema rapidamente ganhou espaço por sua capacidade de resposta automatizada e por seu alcance potencial no sistema bancário.

A doutrina especializada reconhece esse avanço. Para Gustavo Filipe Barbosa Garcia:

“O SISBAJUD representa um importante aprimoramento dos mecanismos de execução, notadamente no processo do trabalho, onde a efetividade é elemento central da prestação jurisdicional.”
(Curso de Direito Processual do Trabalho, 2023)

Maurício Godinho Delgado também destaca:

“Instrumentos tecnológicos que viabilizam a constrição célere de bens do devedor alinham-se ao princípio da razoável duração do processo e à efetividade da tutela jurisdicional.”
(Curso de Direito do Trabalho, 2024)

Porém, a prática forense tem revelado que a simples adoção da tecnologia não garante a efetividade esperada. A atuação técnica e vigilante do advogado continua sendo essencial.

2. Do BACENJUD ao SISBAJUD: o salto tecnológico

O SISBAJUD foi concebido como substituto do obsoleto BACENJUD, trazendo consigo recursos ampliados e maior capacidade de integração com o sistema financeiro nacional. Com a nova plataforma, passou a ser possível realizar bloqueios bancários em tempo real, configurar reiterações automáticas e requisitar documentos diretamente às instituições financeiras, como extratos e faturas.

Com essa automatização, o juiz pode determinar ordens que se repetem até o atingimento do valor executado, reduzindo a dependência de intervenções manuais e acelerando o processo de busca por ativos.

3. A “teimosinha”: quando o bloqueio é contínuo

Entre os recursos mais relevantes da nova ferramenta está a possibilidade de bloqueio reiterado automático, popularmente chamada de “teimosinha”. Essa funcionalidade permite que o sistema continue realizando tentativas de bloqueio diariamente, durante um período previamente fixado, até encontrar valores disponíveis.

A proposta da “teimosinha” é impedir que o executado manipule o momento do bloqueio, mantendo contas zeradas pontualmente. O sistema, ao insistir nas tentativas, aumenta as chances de capturar recursos que entram em circulação após a ordem judicial.

Entretanto, a ativação da “teimosinha” não é padrão. Em muitos processos, a Vara realiza apenas um bloqueio pontual e não configura a reiteração automática, seja por lapso, seja por excesso de cautela. Por isso, é indispensável que o advogado solicite expressamente a utilização desse recurso, e, mais do que isso, verifique se ele foi de fato aplicado. A ausência dessa verificação pode gerar falsas impressões de inexistência de patrimônio, levando a decisões prematuras de arquivamento ou suspensão da execução.

4. O perigo dos bloqueios ineficazes e a aparência de esgotamento

Mesmo com o uso do SISBAJUD, não são raros os casos em que o bloqueio retorna negativo. Isso pode gerar a falsa convicção de que não há bens penhoráveis, quando, na verdade, a ordem de bloqueio pode ter sido limitada, incompleta ou mal executada.

É comum, por exemplo, que em processos com múltiplos executados a ordem de bloqueio seja direcionada apenas à empresa, deixando de fora sócios e corresponsáveis já incluídos na execução. Esse tipo de falha compromete diretamente os resultados da diligência e pode levar ao arquivamento da execução com base em um falso resultado negativo.

5. O dever do advogado: acompanhamento técnico e verificação detalhada

É responsabilidade da advocacia acompanhar detalhadamente cada etapa da execução, conferindo se o SISBAJUD foi aplicado corretamente e se todos os devedores foram atingidos pela ordem. Isso inclui a leitura minuciosa dos despachos, a checagem dos retornos do sistema e a análise dos CPFs ou CNPJs efetivamente bloqueados.

Além disso, cabe ao advogado observar se o juiz determinou ou não a reiteração automática das ordens — a chamada “teimosinha” — e, em caso negativo, requerer sua adoção fundamentadamente.

A atuação proativa do patrono pode evitar prejuízos processuais graves e garantir que a execução não se paralise por omissões administrativas ou erros de servidores. Como já reconheceu o TRT da 2ª Região:

“A simples negativa de êxito no SISBAJUD não afasta o dever de diligência do juízo na busca por outros bens, sob pena de violação ao princípio da efetividade.”
Processo nº 1000642-59.2021.5.02.0701

6. A limitação do SISBAJUD: por que ele não basta

Embora represente uma ferramenta de ponta, o SISBAJUD não resolve todos os problemas da fase executiva. Ele é apenas uma peça dentro de um conjunto maior de mecanismos investigativos, e sua eficácia depende do modo como é articulado com outras medidas.

A execução trabalhista moderna exige a utilização coordenada de sistemas como RENAJUD, INFOJUD, ARISP, CNIB e convênios estaduais, além de diligências específicas baseadas no perfil econômico do executado.

Somente a atuação estratégica e personalizada do advogado poderá transformar decisões em valores recebidos.

7. Propostas para o fortalecimento do sistema

Para que o SISBAJUD atinja seu potencial máximo, é necessário:

  1. Expandir sua integração com o sistema PIX e carteiras digitais.
  2. Firmar convênios com instituições financeiras alternativas, como fintechs.
  3. Aprimorar a formação de juízes e servidores para identificar fraudes patrimoniais complexas.

É apenas por meio de uma abordagem sistêmica — e não isolada — que se alcançará a efetividade na execução.

Conclusão: a execução exige vigilância, técnica e inteligência jurídica

O SISBAJUD representa um avanço real no combate à inadimplência no processo do trabalho. No entanto, sua utilização isolada, sem fiscalização, sem conferência e sem articulação com outras ferramentas, tende a se mostrar insuficiente.

A advocacia deve atuar com rigor técnico, solicitar expressamente a ativação das funcionalidades mais eficazes — como a “teimosinha” — e fiscalizar se a ordem judicial foi corretamente cumprida. Também é essencial verificar se todos os devedores foram incluídos no sistema.

Porque, no final, executar não é apenas usar a tecnologia — é interpretar o processo, agir com estratégia e garantir que cada passo seja eficaz.