quarta-feira, 10 de julho de 2019

Reprovado no exame médico do concurso público? Saiba o que fazer


(10/07/2019)
Após ser aprovado na fase objetiva de um concurso público, o candidato é informado do prazo para tomar posse do cargo e se submeter aos exames médicos necessários.

O objetivo dessa fase de exames é justamente avaliar se o candidato tem aptidão para as atividades do cargo.

O que acontece, muitas vezes, é que, ao se submeter à perícia médica, o candidato é surpreendido com a sua reprovação. E os motivos podem ser vários.

Recentemente, recebemos em nosso escritório uma cliente que foi aprovada no concurso para o cargo de Técnico de Enfermagem de um Hospital. Ao passar pela perícia médica, no entanto, a cliente foi surpreendida com o parecer médico indicando inaptidão para o cargo.

O motivo? Obesidade mórbida.

A pergunta é: será que é justo uma candidata que demonstrou conhecimento técnico para o cargo e foi aprovada na fase objetiva ser eliminada por uma questão tão subjetiva como esta, ou seja, estar acima do peso?

Os exames médicos são importantes para que somente os candidatos que realmente tenham condições de exercer as atribuições do cargo possam tomar posse.

Mas cada caso é um caso.

Por exemplo, um candidato ao cargo de policial militar precisa sim estar em forma para exercer suas atribuições, sob pena de colocar em risco não só a sua segurança, mas a dos cidadãos que se propôs a proteger.

Agora, será que uma candidata que está acima do peso não possui condições de exercer as atribuições de técnico de enfermagem?

Acompanhe o texto de hoje!


O Princípio da Motivação dos atos administrativos


Antes de qualquer coisa, você precisa entender que todo ato administrativo deve ter um motivo para que seja realizado.

Em outras palavras, todas as “decisões” da Administração Pública, como dar ou não a um candidato a posse no cargo, por exemplo, devem ser baseadas em uma justificativa plausível.

No caso da posse, a aprovação em todas as fases do concurso. No caso da eliminação, os seus motivos concretos. 

Se não há essa justificativa ou ela é abstrata e genérica, o ato administrativo é nulo.


A motivação dos atos administrativos na prática


A administração pública não pode simplesmente considerar inapto um candidato se essa decisão não tiver relação com a realidade. Ou seja, para motivar a reprovação no concurso, a administração deve demonstrar quais atividades ou atribuições foram comprometidas em razão do quadro de saúde do candidato.

Vamos entender esse Princípio da Motivação voltando ao caso da candidata que não foi aprovada na perícia médica em razão de sua obesidade.

A descrição das atribuições do técnico de enfermagem tinha apenas características técnicas de baixa ou quase nenhuma exigência física, de modo que o quadro de obesidade da candidata não poderia ter sido considerado, por si só, um motivo para sua reprovação.


Será que a candidata realmente não possuía condições de exercer o cargo de técnico de enfermagem?

Bom, diante dessas explicações, fica claro que o quadro de saúde da candidata não era motivo suficiente para eliminá-la do concurso, pois não a impedia de exercer nenhuma das funções descritas no edital!


Como os Tribunais vêm entendendo essa questão?


Justamente por ser um ato muito subjetivo, que envolve analisar se uma pessoa tem ou não aptidão para exercer um cargo com base na sua saúde, muitas eliminações acabam indo parar na justiça.

Existem muitas decisões favoráveis a candidatos reprovados em exames médicos. Veja:

(...) Candidato aprovado em concurso público, considerado inapto por perícia médica, em razão de ter obesidade mórbida. Ausência de razoabilidade do ato impugnado, uma vez que o candidato demonstrou estar apto ao exercício das atividades que o cargo exige. Possíveis comorbidades que não são suficientes para obstar o direito à nomeação e posse (...) Sentença de improcedência parcialmente reformada Recurso parcialmente provido. (Apelação nº 1001451-59.2015.8.26.0053 / apelante: Luiz Valentim Pignatari Júnior / apelada: Fazenda Do Estado De São Paulo - PONTE NETO Relator.)

Uma questão muito importante que foi destacada nessa decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo é a de que o problema de saúde, por si, só não é motivo suficiente para considerar o candidato inapto para o exercício do cargo.

Para que seja eliminado, esse quadro de saúde deve ser incompatível com as atribuições do cargo desejado, sob pena de negar-lhe o direito da posse sem uma justificativa real.

Veja essa outra decisão muito interessante sobre a reprovação no exame médico:

(...) CONCURSO PÚBLICO. EXAME MÉDICO. EXCLUSÃO DE CANDIDATO DE FORMA DESMOTIVADA. NÃO-CABIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. É incabível a eliminação de candidato considerado inapto em exame médico em concurso público por motivos de ordens abstrata e genérica, situadas no campo da probabilidade. Impõe-se que o laudo pericial discorra especificamente sobre a incompatibilidade da patologia constatada com as atribuições do cargo público pretendido. 2. Recurso ordinário provido. (STJ, 5º T, Rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 10/09/2009, vu).

Nessa decisão, os Julgadores entenderam que o laudo pericial deve esclarecer de maneira específica como os problemas de saúde do candidato o impedem de exercer o cargo.

Portanto, não basta que o candidato apenas tenha um problema de saúde. É preciso que fique demonstrado no laudo pericial que esse problema o impede de exercer as suas atribuições.


Conclusão

A aprovação em um concurso público é o sonho de muita gente. Alguns querem aquela estabilidade no emprego, enquanto outros buscam os benefícios financeiros.

A verdade é que esse sonho pode se tornar um pesadelo nas fases que sucedem a prova objetiva, principalmente quando há exames físicos e médicos, que podem ser muito subjetivos.

Essa cliente que mencionamos no exemplo já havia exercido o cargo de técnico de enfermagem de maneira temporária, e prestava o concurso com o objetivo apenas de assumir um cargo melhor de maneira definitiva.

O exame médico é tão subjetivo que, mesmo tendo exercido o cargo anteriormente, há pouco tempo, aliás, a candidata foi considerada inapta no exame realizado pelo próprio Estado de São Paulo.

Por isso, se você estuda para concurso, fique atento quanto à motivação dos atos da administração pública e garanta seus direitos.